A norte do tempo

dunas do deserto
Quando o vento soprar de sul e alisar as dunas
procuro um lugar onde pousar a cabeça
e espero que a sombra desfocada da noite 
desça da folha ao chão. 

Subindo ao topo do abismo procuro os ninhos das águias
nas falésias escarpadas 
onde as unhas rasgam pedra dura
e cavam sepulturas onde o vento cego não entra.

A morte tem aí um sentido único que é o das alturas:
todos procuramos um lugar onde nos esconder 
numa viagem de sucessivas desaparições
onde o manto das sombras não clarifica o riso dos vivos.

Atrás do espelho 
que sempre nos espelhou a vida 
está a lâmina pontiaguda com que se cortam os pulsos;
viver é este permanente contacto com a palidez da morte.

Suspensas estão as pontes, os caminhos silenciosos, os rostos misteriosos, 
as palavras que nos arrepiam os cabelos e incham os toldos dos mastros
com a fúria dos ventos. 
Outro tempo virá mais luminoso e, finalmente, poderei ser eu 
a decidir a hora da rapina e se quero morrer virada para norte.

Photo by Ze Paulo Gasparotto on Unsplash

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